28/11/2016 14:36 - Fonte:
O Tribunal de Justiça do Estado do São Paulo (TJ-SP) foi palco na tarde do dia 25 de novembro de palestra sobre o Provimento nº 52/2016da Corregedoria Nacional de Justiça, que regulamenta os nascimentos decorrentes de reprodução assistida e amplia a presunção de paternidade para as hipóteses de união estável. A apresentação fez parte da programação do 73º Encontro Nacional de Corregedores Gerais da Justiça (Encoge).
O assunto gerou ampla repercussão dentro da 73ª edição do Encoge e produziu uma proposta para a Carta final do evento, na qual o registro de nascimento deva ser tratado de forma diferente em cada um dos casos de utilização da técnica, devendo-se preservar o anonimato do doador de embriões e de seu eventual cônjuge ou companheiro, dispensando-se a apresentação de consentimento do marido ou companheiro da doadora temporária de útero e a lavratura de escritura pública nos documentos decorrentes desta regulamentação. Clique aqui e leia a íntegra da Carta de São Paulo.
O tema teve início com uma explanação técnica sobre a reprodução assistida, proferida pelo doutor em Urologia pela Universidade Federal de São Paulo (USP) e diretor científico do Fertility Medical Group, Edson Borges Junior. O especialista abordou o contexto social do tema, citando que agora as mulheres estão demorando mais para engravidar (acima dos 30 anos), além de abordar os três tipos de famílias hoje existentes: tradicional, monoparental e biparental.
Borges Júnior também informou que 0,2% das crianças nascidas no Brasil são concebidas por este método e que a tendência é que os casos aumentem, uma vez que os casais estão decidindo ter filhos cada vez mais tarde. “A verdade é que, principalmente com a entrada da mulher no mercado de trabalho, elas passaram a focar mais na carreira do que na vida pessoal, e isso invariavelmente adia a concepção de uma criança e, quando isso acontece, o casal muita das vezes prefere o método por reprodução assistida”, disse.
Durante sua apresentação, o especialista se mostrou apreensivo com a exposição do doador de sêmen para a reprodução assistida. “O que ao meu ver parece um pouco agressivo é que o doador precisa cadastrar todos os dados, principalmente os fenótipos, que ficarão guardados por 20 anos e deverão ser apresentados ao cartório na hora do registro de nascimento da criança pelos pais beneficiados, o que fere o princípio de sigilo dos dados da pessoa”, disse.
Para falar sobre os aspectos legais da questão foi convidado o desembargador do TJ-SP Francisco Eduardo Loureiro. O magistrado explicou que há um vazio legal no País sobre a questão, com dois projetos de lei, um de 2012 e outro de 2015, tramitando lentamente no Legislativo federal. Para suprir o vácuo, o CNJ e o Conselho Federal de Medicina editaram resoluções sobre o tema: a 2121/15 pelo CFM e o 52/16 do CNJ.
Para o desembargador, a Resolução, que trata da emissão de certidão de nascimento dos filhos cujos pais optaram pela modalidade, deve ser debatida, especialmente na medida em que pode interferir no anonimato do doador e no desejo dos pais de manter segredo. “Na minha opinião, a resolução não é ruim, mas a ideia precisa ser melhor debatida até mesmo para padronizar todo o processo no País. Um exemplo de que é preciso aprimorar a questão é a necessidade de uma escritura pública na hora de registrar uma criança. Os pais precisam deste documento para fazer, mas como fica o sigilo do doador?”, questionou.
Em seguida, o desembargador Cláudio Luiz Bueno de Godoy falou sobre como a questão é tratada no mundo. O magistrado concordou com a posição do desembargador Loureiro, de que a resolução do CNJ foi necessária, mas necessita de maior debate para preservar a privacidade das partes, e ainda fez um acréscimo sobre a possibilidade da ascendência genética. “Uma questão que precisa ser melhor debatida é a necessidade de a pessoa gerada por reprodução assistida procurar, no futuro, saber sua ascendência genética. Agora pensem: Este Direito que ele tem vai contrapor o Direito que o doador tem de exigir sigilo de informações, até porque todas as informações sobre o doador ficam registradas no banco de dados dos cartórios!”, indagou.
Godoy também aproveitou ocasião para tocar no tema da presunção de paternidade. “A resolução do CNJ permite que haja o registro de nascimento de alguém que não seja filho de pessoas casadas, desde que haja pelo menos a união estável. Volta a mesma questão. Então porque é que, dos genitores, a mãe pode registrar o seu filho sem a presença do marido? Por conta do dever de fidelidade do casamento. Mas como sabemos que a criança nasceu? Fazemos uma conta média pela idade de nascimento da criança, depois considera-se o prazo mínimo de gravidez de seis meses e o prazo máximo de dez meses. Então fica fácil para o registrador presumir quando o casal é casado. Mas e quando é caso de união estável, como podemos fazer este tipo de previsão?” concluiu.