Foi aberto às 14h desta quarta-feira (23), no Senado Federal, painel sobre o tema “Infância em famílias homoafetivas – Questões afetivas, jurídicas e sociais”, encabeçado por Lídice da Mata, senadora e coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos das Crianças e Adolescentes. Ao lado dela, também esteve presente Vera Aparecida Pavan Erthal Risi, presidente da Associação Brasileira de Terapia Familiar (Abratef). Ambas falaram sobre aspectos do Estatuto das Famílias (PLS 470/2013), projeto arquitetado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e proposto pela senadora. O evento é parte da IX Semana de Valorização da Primeira Infância e Cultura da Paz, que se estenderá até a próxima sexta-feira (25), tendo como tema central ‘A Primeira Infância e os Desafios do Milênio’.
“Diante do cenário atual, em que muitas famílias buscam gerar seus filhos com as diversas e inúmeras possibilidades existentes, não cabe mais manter a filiação somente com base na identificação do vínculo genético. É preciso ter como foco principal a afetividade, que se encontra presente na definição de família hoje aceita juridicamente e que apresentamos em nosso projeto. Trata-se de uma nova figura jurídica, a filiação socioafetiva, que acabou se sobrepondo à realidade biológica”, revelou Lídice da Mata, em seu site oficial.
A IX Semana de Valorização da Primeira Infância e Cultura da Paz conta com o apoio da Embaixada da França e de outros parceiros institucionais. O evento é voltado para representantes dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, bem como para pedagogos, educadores, profissionais da saúde, psicólogos, além do público em geral.
A Semana ainda trará à tona temas como o impacto no brincar e na vida em geral das crianças com a entrada da tecnologia no cotidiano infantil; a terceirização no cuidar e na mediação social das crianças; a importância da educação sobre transmissão transgeracional; as infâncias ainda invisíveis no País; e o impacto de separações parentais, tanto por divórcio quanto pela impossibilidade do convívio, especialmente da figura paterna. O evento se encerrará com o lançamento de livros sobre a primeira infância.
Estatuto das Famílias: porque todas famílias precisam e merecem
Família “doriana”, buscapé, tradicional, recomposta, binuclear. Independentemente da configuração, é premente entender que todas merecem especial apoio e proteção do Estado. Para que isso aconteça, o Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM apresentou, em 2013, por meio da senadora Lídice da Mata, o Estatuto das Famílias (PLS 470/2013), no plural, a maior proposta em tramitação no Congresso para amparar todas as famílias. O texto do Estatuto das Famílias compreende todas as modernas e reais formas de composição familiar e suas implicações.
O objetivo é reunir, em um documento jurídico único, todas as normas relacionadas com o Direito das Famílias, permitindo tornar a Justiça mais ágil e conectada com a realidade familiar brasileira. As ações de família normalmente são as que mais abarrotam as defensorias públicas, o Ministério Público nos estados e tribunais de Justiça. Segundo o jurista Rolf Madaleno, diretor nacional do IBDFAM, o cidadão brasileiro deve defender a proposta do Estatuto das Famílias porque o projeto representa a modernidade de um verdadeiro e esperado diploma que regulamenta a realidade da família brasileira e contemporânea, considerando que o Livro do Direito de Família do Código Civil de 2002 já nasceu defasado e corroído pelo tempo que ficou em tramitação para ser aprovado 27 anos depois de sua criação, transformando-se em uma "colcha de retalhos", tanto que tão logo aprovado o vigente Código Civil já existia novo projeto de lei para alterar e aperfeiçoar vários de seus dispositivos.
Na apresentação do PLS 470/2013, a senadora Lídice da Mata defendeu que a atual legislação está ultrapassada em relação à realidade da família que, hoje, deixou de ser essencialmente um núcleo patrimonialista para dar lugar à livre manifestação do afeto. Segundo ela, é necessário adequar as regras às novas formatações que não são protegidas pela legislação atual. O Instituto busca dar mais visibilidade à proposta para que sejam realizadas audiências públicas com a sociedade, uma forma de ainda mais atender aos anseios das famílias brasileiras. O que levou o IBDFAM a criar o projeto de lei, de acordo com Rolf Madaleno, foi justamente a distância e contrariedade percebida entre o Código Civil, a Constituição Federal e os direitos esperados para uma família que se ancorava no tripé da igualdade dos filhos, dos sexos e na diversidade das entidades familiares, sendo fácil notar que até hoje o Código Civil em vigor apresenta ranços de uma família discriminada, como sucedia, por exemplo, com a presunção de paternidade inerente apenas ao casamento, e a ausência da filiação socioafetiva que segue discriminando ou priorizando a família biológica em comparação com a filiação socioafetiva, ou que ignorava a família homoafetiva.
O projeto foi atualizado e apresentado no Senado Federal em razão das constantes mudanças legislativas que ocorrem no País. Para Madaleno, foi importante atualizá-lo. “Talvez um belo exemplo de atualização da legislação possa ser buscado na Argentina que reescreveu o seu Código Civil e Comercial, com singular destaque para o Direito de Família, absolutamente moderno, coerente e consentâneo com a realidade e os anseios da família atual, tendo sido esta a proposta do Estatuto das Famílias”, garantiu. Os principais benefícios para a população brasileira com a aprovação do Estatuto das Famílias são, para ele, acima de tudo, um diploma de inclusão, que não mais discrimina.
“Fica difícil mencionar pontualmente as principais alterações verificadas no Estatuto das Famílias comparado com o Código Civil, mas com efeito, que a sociedade brasileira ganha com a sua aprovação legislativa, especialmente porque apresenta um direito de família atual, contemporâneo, contextualizando os fatos, os costumes, o comportamento social e preenchendo as lacunas que a evolução social deixou nítido no livro do Direito de Família do Código Civil de 2002. O Estatuto deixa de regulamentar o processo de habilitação para o casamento, uma regra administrativa e desfocado da função do Código Civil, assim como moderniza as ações e execuções de alimentos, trata do cadastro dos maus pagadores de alimentos, a investigação de parentalidade, mais ampla do que investigar apenas a paternidade, moderniza os regimes patrimoniais e elimina o natimorto regime da participação final nos aquestos, tal qual corta qualquer sopro de discussão acerca do fim da separação judicial ou extrajudicial, cuidando em cada linha e cada artigo de avançar e de modernizar, prestando um serviço de excelência à sociedade e à família brasileira”, garantiu.
Rolf explica que o Estatuto das Famílias defende a família, cuja entidade se constitui das mais diferentes formas, pois não há como considerar família apenas o modelo conjugal e disto já se dera conta a Carta Federal de 1988 ao abrir para uma visão plúrima de constituir família, e este foi o começo de uma importante mudança, mas que não termina nos modelos constitucionalmente citados, e não fosse assim, não teria o STF reconhecido uma entidade familiar na união homoafetiva. A família não está no modelo majoritário, também está no diferente, que não o torna menor e muito menos marginal, e como marginal vivemos anos excluindo o maior de todos os modelos de família, consistente no "concubinato", que depois a Carta Política redesignou de união estável. E conclui: “O Estatuto das Famílias representa a atualização e a contemporização do Direito de Família; representa incluir os excluídos, aceitar a diversidade; priorizar o afeto e reconhecer sua supremacia”.