06/01/2016 16:40 - Fonte: IBDFAM
Relator: Vanessa Verdolim Hudson Andrade
Tema(s): Ação de anulação de registro c/c negatória de paternidade post mortem Ilegitimidade ativa dos avós paternos
Tribunal TJMG
Data: 05/01/2016
Chamada
Jurisprudência na integra
Ementa na Íntegra
EMENTA: RECURSO DE APELAÇÃO - DIREITO DE FAMÍLIA - AÇÃO DE ANULAÇÃO DE REGISTRO C/C NEGATÓRIA DE PATERNIDADE AJUIZADA PELOS AVÓS APÓS O ÓBITO DO GENITOR - SUPOSTO ERRO DA ANULAÇÃO DE REGISTRO FUNDADO EM NEGATIVA DE PATERNIDADE - CARÁTER PERSONALÍSSIMO DA ASSUNÇÃO DA PATERNIDADE É PERSONALÍSSIMA - ILEGITIMIDADE ATIVA DOS AVÓS - SENTENÇA CONFIRMADA.
- A regra é de que ninguém possa pleitear em nome próprio direito alheio (art. 6º do CPC), bem como ninguém possa vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento (art. 1.604 do Código Civil). No entanto, tais regras não são absolutas, sendo possível mitigar a primeira em virtude de lei e a segunda por erro ou falsidade do registro.
- A negativa de paternidade não se inclui entre uma das hipóteses de ocorrência de erro ou falsidade de registro, ela deve ser provada por meio de ação negatória de paternidade, que é personalíssima, sendo que sua propositura só pode ser feita pelo próprio genitor.
- Se o pai não negou a paternidade enquanto vivo, seja porque era mesmo o pai biológico, seja porque, não o sendo, assumiu voluntariamente a paternidade, não cabe aos avós, com o seu óbito, tentar desfazer o reconhecimento da filiação. O art. 1.601 do Código Civil adota o caráter personalíssimo da assunção da paternidade.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0115.10.001751-2/001 - COMARCA DE CAMPOS ALTOS - APELANTE(S): M.F.S. E OUTRO(A)(S), R.M.S. - APELADO(A)(S): W.H.F. REPRESENTADO(A)(S) P/ MÃE C.T.H.V.
A C Ó R D Ã O
(SEGREDO DE JUSTIÇA)
Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
DESA. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE
RELATORA.
DESA. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE (RELATORA)
V O T O
Trata-se de recurso de apelação interposto às fls. 248/263 por M.F.S. e R.M.S. nos autos da ação anulatória de registro civil c/c negatória de paternidade que movem contra W.H.F., representado por C.T.H.V., demonstrando inconformismo perante a sentença proferida às fls. 244/246, que extinguiu o processo sem resolução do mérito, com fulcro no art. 267, VI, do Código de Processo Civil. Condenou os requerentes ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que arbitrou em R$600,00 (seiscentos reais) e suspendeu a exigibilidade das verbas em face da gratuidade da justiça.
Em suas razões recursais, os apelantes pedem que seja decretada a nulidade da sentença, afirmando que os avós tem legitimidade para propor a negatória de paternidade. Alegam que a genitora do menor se negou a fazer o DNA e que o exame era essencial para averiguar a paternidade, já que ela mantinha relações com vários homens. Impugnam a veracidade dos depoimentos das testemunhas trazidas pela autora. Salientam que não foi possível a configuração de vínculo sócio-afetivo entre o menor e o de cujus, pois o lapso temporal entre o nascimento daquele e a morte deste foi de apenas 56 (cinquenta e seis) dias. Explana que o de cujus foi levado a erro quando registrou o menor. Pugnam pela procedência do recurso.
Contrarrazões às fls. 266/270, pelo desprovimento do recurso aviado.
Parecer da d. Procuradoria Geral de Justiça às fls. 276/281, pela manutenção do julgado.
É o relatório.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da apelação interposta.
O menor nasceu em 05/04/2010 na cidade de Patos de Minas/MG e sua filiação foi atribuída no registro civil a N.F.S. e C.T.H.V., conforme certidão de nascimento à fl. 21. Aproximadamente (três) meses depois no nascimento, em 04/07/2010 especificamente, o genitor faleceu, conforme certidão de óbito à fl. 22.
Em novembro do ano de 2010 foi proposta a presente ação pelos avós do menor W.H.F., que, negando que seu falecido filho é pai do menor, pretendem a anulação do registro.
A pretensão foi indeferida pelo juiz a quo, que julgou o processo extinto sem resolução do mérito por ilegitimidade passiva dos autores, avós da criança.
A certidão de nascimento é documento hábil para comprovar a filiação de uma pessoa. Contudo, havendo erro ou falsidade no registro, é possível sua desconstituição. Sobre o tema, assim dispõe nosso Código Civil:
Art. 1.603. A filiação prova-se pela certidão do termo de nascimento registrada no Registro Civil.
Art. 1.604. Ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro.
A regra é de que ninguém possa pleitear em nome próprio direito alheio (art. 6º do CPC), bem como ninguém possa vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento (art. 1.604 do Código Civil). No entanto, tais regras não são absolutas, sendo possível mitigar a primeira em virtude de lei e a segunda por erro ou falsidade do registro.
Após minuciosa analise dos autos, o que se extrai da inicial é que os autores pretendem se agasalhar em tais exceções para que seja desconstituída a paternidade do menor W. que foi reconhecida pelo falecido N., o que não pode ser admitido.
Embora a certidão de nascimento possa ser modificada se for provado erro ou falsidade de registro, é certo que a negativa de paternidade não se inclui entre uma das hipóteses de ocorrência de erro ou falsidade de registro. O STJ entende que o erro que autoriza a anulação do registro é o engano não intencional na manifestação da vontade de registrar, sendo necessário prova robusta de que o genitor foi induzido a erro ou coagido para realizar o registro. Confira-se:
DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FAMÍLIA. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. ANULAÇÃO DE REGISTRO DE NASCIMENTO. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO: ARTS. 1.604 e 1.609 do Código Civil.
1. Ação negatória de paternidade, ajuizada em 14.08.2006. Recurso especial concluso ao Gabinete em 14.06.2013.
2. Discussão relativa à nulidade do registro de nascimento em razão de vício de consentimento, diante da demonstração da ausência de vínculo genético entre as partes.
3. A regra inserta no caput do art. 1.609 do CC-02 tem por escopo a proteção da criança registrada, evitando que seu estado de filiação fique à mercê da volatilidade dos relacionamentos amorosos. Por tal razão, o art. 1.604 do mesmo diploma legal permite a alteração do assento de nascimento excepcionalmente nos casos de comprovado erro ou falsidade do registro.
4. Para que fique caracterizado o erro, é necessária a prova do engano não intencional na manifestação da vontade de registrar.
5. Mesmo que não tenha ficado demonstrada a construção de qualquer vínculo de afetividade entre as partes, no decorrer de mais de 50 anos, a dúvida que o recorrente confessa que sempre existiu, mesmo antes da criança da nascer, de que ele era seu filho, já é suficiente para afastar a ocorrência do vício de consentimento - erro - no momento do registro voluntário.
6. No entendimento desta Corte, para que haja efetiva possibilidade de anulação do registro de nascimento, é necessária prova robusta no sentido de que o pai foi de fato induzido a erro, ou ainda, que tenha sido coagido a tanto.
7. Recurso especial desprovido.
(REsp 1433470/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/05/2014, DJe 22/05/2014)
A negativa de paternidade, a contrario sensu do que pretendem fazer crer os apelantes, deve ser provada por meio de ação negatória de paternidade que é personalíssima, sendo que sua propositura só pode ser feita pelo próprio genitor.
Se o pai não negou a paternidade enquanto vivo, seja porque era mesmo o pai biológico, seja porque, não o sendo, assumiu voluntariamente a paternidade, não cabe aos avós, com o seu óbito, tentar desfazer o reconhecimento da filiação. O art. 1.601 do Código Civil adota o caráter personalíssimo da assunção da paternidade.
Com tais considerações, nego provimento à apelação, mantendo in totum o julgado que conclui pela ilegitimidade dos avós para figurarem no pólo ativo da demanda.
Custas recursais, na forma da lei.
DES. ARMANDO FREIRE (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. ALBERTO VILAS BOAS - De acordo com o(a) Relator(a).